6/08/2007

Marvado rock

Ilustrada de hoje

Bandas da nova geração, como Supercordas e Charme Chulo, revisitam temática rural

THIAGO NEY
DA REPORTAGEM LOCAL

Roqueiro brasileiro é urbano. Envelhece na cidade, convive com bichos escrotos, na sexta-feira vai pra zona da cidade gastar o dinheiro de rapaz trabalhador, se prepara para dormir enquanto o mundo inteiro acorda... Mas tem roqueiro jovem migrando para o campo, descrevendo paisagens, riachos e empunhando viola caipira.
Supercordas e Charme Chulo, duas bandas novíssimas, colocam e resgatam em seus discos de estréia a temática rural que marcou o pop brasileiro no início dos anos 70, principalmente por Sá, Rodrix & Guarabyra. Aliás, a expressão "rock rural" foi utilizada para classificar a música do trio.
O termo surgiu a partir da canção "Casa no Campo" (primeiros versos: "Eu quero uma casa no campo/ Onde eu possa compor muitos rocks rurais"), composta por Rodrix e Tavito, gravada depois por Elis Regina.
"Na época, 1972, tentaram nos chamar de "caipiras progressivos'", lembra Rodrix. "Depois de "Casa no Campo", criaram esse rótulo "rock rural".".
Pois o rótulo volta a ser (bem) usado. Além do auxílio de instrumentos pouco usuais no gênero, como viola caipira e viola de arame, Supercordas e Charme Chulo tratam em suas letras de temas mais cantados por duplas caipiras do que por bandas roqueiras.
"Em quarqué lugar/ Tem um sapo a espreitar/ Pronto pra pular/ No urbano que passar", diz o Supercordas em "Frog Rock", uma das 12 canções de "Seres Verdes ao Redor", o criativo e inusitado primeiro disco da banda carioca. "Essa ruralidade é uma característica do disco. Tem esse tema fechado, da vida na roça. É como um escapismo da realidade urbana", afirma Pedro "Bonifrate" (eles utilizam sobrenomes como Valentino, Giraknob e Wakaplot).
Lançado no final de 2006, "Seres Verdes ao Redor" é dos mais refrescantes e originais discos recentes do pop brasileiro. Não apenas por incorporar Sá, Rodrix & Guarabyra ("Na verdade, nem conhecíamos eles. Depois que lançamos o disco é que notaram semelhanças", diz Bonifrate), mas por pincelar elementos psicodélicos em músicas como "3.000 Folhas". No site da banda (www.supercordas.com), Bonifrate descreve o som do grupo como "ruraldélico".
"É quase uma necessidade espiritual fazer um som brasileiro. Acho patético um artista que apenas emula uma banda gringa. Tem muita banda assim por aí...", diz o vocalista. "Não vejo muito sentido nessa paranóia de inovação, de fazer algo que nunca foi feito antes. Temos que olhar um pouco mais para trás, para as tradições."

Preconceito
E olhar para as tradições é o que faz a paranaense Charme Chulo. Em seu disco de estréia, que acaba de sair pelo selo Volume 1, a banda olha não apenas para a tradição do rock inglês dos anos 80 (Echo, Smiths...) como para a tradição da música caipira brasileira.
"Na adolescência normalmente se ouve pop, rock. Mas eu ouvia música caipira em Maringá. Tínhamos necessidade de colocar algo que tivesse a ver com onde viemos", conta Igor Filus, 26, vocalista do grupo, que cita como influências Tião Carreiro e Pardinho, Almir Sater, Roberto Correia. "Existe preconceito [contra a música caipira]. É um dos assuntos de que tratamos. Tentamos conectar isso com rock e punk."
Música caipira e punk. Pelas mãos do Charme Chulo, dá certo. O disco, homônimo, traz canções como "Mazzaropi Incriminado" e "Barretos", entre outras que trazem o bom duelo de viola caipira com uma bateria enérgica e de compassos roqueiros. "Nos shows, o público sente que é algo inusitado, no começo estranham um pouco, pois a viola tem um som muito forte", diz Filus. Dá para ouvir no www.charmechulo.com.br. Hoje fazem show em SP, no Inferno (r. Augusta, 501; tel. 0/ xx/11/3120-4140; 23h; R$ 15).

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