5/27/2008
FAÇA POR VOCÊ MESMO (cena é o caralho!)
Julieta, Paulinha e Marcelo "Boralá" se fartando na Carlão Party Sound 3: ô vida drurys!
Charme Chulo botando lenha na fogueira!
Folhetim Urbano na área: os donos da bola e realizadores natos!
Marcos "Jason" Linari: esse é o cara!
Rubão e eu: Dusty de volta? sei lá, mil coisas!
Quando eu e a Adri viemos pra Curitiba, no início dos anos 90, um amigo nosso, o Felipe, soube que a gente tava fazendo um documentário de conclusão de curso sobre música paranaense, e nos disse logo: “vocês têm que conhecer o 92!”. Então, numa dessas típicas tardes de domingo de outono de Curitiba, nós adentramos em uma portinha sem qualquer identificação, que levava para uma escada, que por sua vez chegava a um porão escuro e enfumaçado, que abriu uma porta pra um novo mundo. Um mundo onde a gente não precisava mais simplesmente ficar pagando pau pros gringos, porque aquela música tava sendo feita ali, por pessoas de verdade, carne e osso, que a gente podia encontrar por aí pela cidade. Pessoas como a gente, que tinham na música uma saída pra esse mundo sem volta, que encontram nela uma forma de expressão e de redenção.
Pois bem, desde aquele dia, meu sonho e objetivo passou ser ter uma banda e tocar no 92. Isso era o máximo pra mim, porque desde que eu vi gente como o Camarão, Rodriguinho Genaro, Jahir Eleutério detonando com o Acrilírico no palco do Porão, ou a Relespública fazendo miséria no mesmo lugar, ou o Rubens e o Coelho terminando o show da July et Joe tocando baixo e guitarra deitados no show, eu sabia que era aquilo que eu queria fazer. Nem mais, nem menos.
Levou muitos anos pra que isso acontecesse, e até lá, a minha banda, o OAEOZ rodou todos os muquifos da cidade, de QG, a café Beatnik, passando por bares de metaleiros no largo da Ordem, Cafénobule, festas em chácaras, teatros como o Kraide e o Paiol, e por aí vai. De lá pra cá o 92 já abriu e fechou várias vezes, mudou de lugar e muita coisa aconteceu. Mas na essência eu continuo querendo as mesmas coisas.
Falo isso agora porque nesses três dias de festividades da terceira Carlini Sound Party and Psy Trance Experience, como era inevitável, a gente conversou muito sobre todo esse lance que envolve fazer e principalmente continuar fazendo música nesse nosso mundinho, no momento em que o mundo e em especial a indústria da música parece desabar ao seu redor, e ninguém na verdade parece saber exatamente o que vai acontecer. E aí eu me lembrei disso, e também me lembrei que do Linari falando pra mim quando a gente teve lá em Osasco em março, que o sonho dele quando começou a tocar em banda era encher um lugar com cem pessoas. E me lembrei do cara do White Stripes (banda que eu não gosto) mas que fala em entrevista da Rolling Stone desse mês dizendo que no começo da banda eles pensavam “se pudermos encontrar 100 pessoas em cada cidade pra manter a coisa em movimento” era isso que eles precisavam.
Enfim, to falando tudo isso porque vejo que as pessoas e as situações mudam, mas muitas vezes as coisas se repetem. O fato é que a maioria de nós começou nesse negócio pra se divertir e fazer boa música, juntar os amigos e ter algumas horas de alegria, e é claro, sentir que pode fazer algo relevante na vida além de se arrastar por aí de casa pro trabalho-futebol-igreja-fantástico no fim de semana. Alguma coisa que nos faça sentir vivos de verdade.
Só que as ambições que o próprio mundo infla muitas vezes faz com que, com o tempo, a gente perca essa perspectiva, e comece a pirar e a alimentar expectativas irreais, que só servem pra produzir frustrações, e atrapalhar aquilo que realmente é importante. Digo isso porque como já citei no texto abaixo e repeti pra algumas pessoas durante esses últimos dias de festa, não agüento mais esse papo de “porque a cena aquilo, porque as bandas isso” e não sei o que, enfim essa ladainha toda que as pessoas insistem em desfiar ininterruptamente, e que na minha opinião, não leva a absolutamente nada. Há muito tempo eu já senti que o que importa é você fazer o que gosta, e que “dar certo” não significa necessariamente ter uma carreira profissional como “artista”, mas sim construir um trabalho que você possa ter prazer em ouvir e orgulho de saber que foi você quem fez. Todo o resto é ilusão, fantasia, coisas que esse mundo de competitividade exacerbada colocam na nossa cabeça, e que a gente acaba acreditando, até pela tendência natural do ser humano de nunca estar satisfeito com nada. Me lembro desses dias a gente lá no Carlão, em um sábado à tarde, ensaiando com o OAEOZ, e o Camarão dizendo: “poxa, é engraçado, eu vejo hoje que se tivesse grana, fosse rico, estaria fazendo exatamente o que estou fazendo agora, ou seja, reunido no sábado a tarde com os amigos fazendo um som, tomando uma cerveja”. É EXATAMENTE ISSO! A gente ta tão acostumado a ficar pensando naquilo que a gente poderia fazer, em como o mundo seria diferente se a gente tivesse dinheiro, fosse famoso, fizesse sucesso e todas essas fantasias que enfiaram na nossa mente que muitas vezes não consegue perceber e aproveitar as coisas boas que estão acontecendo aqui e agora, bem na nossa frente. Como dizia Lennon: “A vida é o que acontece quando estamos fazendo planos”.
Pois hoje mais do que nunca eu sei e sinto que a gente é aquilo que a gente faz, que realiza, e não o que fala, que discursa, que planeja sem nunca dar o primeiro passo pra tornar realidade. E olhando pra trás, posso dizer sem nenhum medo de estar sendo arrogante ou pretensioso, que a gente fez muita coisa legal, e realizou até muito mais do que eu particularmente esperava, desde que entramos pela primeira vez no porão do 92, e saímos de lá cheio de desejos e idéias.
De lá pra cá a gente se tornou amigo e parceiro de grande parte daqueles caras que via no palco fazendo aquelas coisas maravilhosas e incríveis, e só isso pra mim já seria o suficiente pra ficar feliz. Mas mais ainda, a gente construiu um trabalho, uma obra, que se não tem relevância pro mercado ou pros “especialistas”, conta a nossa história de uma forma contundente, como ninguém mais poderia fazer. E fico ainda mais feliz que as sementes que a gente espalhou por aí germinaram e produziram frutos maravilhosos. Fico extremamente feliz, por exemplo, em ver uma banda como o Charme Chulo, que a gente conhece desde a primeira demo, e que um dia veio nos procurar querendo uma chance de tocar no Rock de Inverno, ver como eles cresceram, amadureceram e se tornaram artistas de altíssimo nível, e o que é mais importante, mantendo o pé no chão, e sem perder a clareza das coisas que são realmente importantes, a amizade e o companheirismo que no final das contas está na raiz dessa coisa toda de fazer música. Ver que eles mesmo tendo motivos de sobra pra isso, mesmo hoje sendo uma banda conhecida no País inteiro, se apresentando nos maiores festivais brasileiros (por méritos totalmente próprios, talento, e por não ficarem de conversa mole de que não tem apoio, não tem espaço, mas por terem corrido atrás e conquistado o que merecem) não perdem a chance de fazer um som na festa do Carlão, lá com os amigos, sem nenhum "glamour", muito menos preocupação que não promover alegria e se divertir. Essa é a chave de tudo, na minha opinião. Por mais que você tenha ambições nesse meio, é fundamental não perder a perspectiva das coisas, não esquecer que a essência de tudo é essa. Do contrário, você correrá o sério risco de se frustrar e acabar jogando a toalha.
E como disse, não agüento mais ver neguinho repetindo a cantinela de que “porque que a cena não dá certo”, “porque que as bandas não são conhecidas”, etc, e tal. Porra, será que os caras não perceberam que o mundo mudou, e que essa coisa de artista como um ser iluminado e acessível, isolado em um olimpo, rodeado de gueixas e andando por aí de limusine é um negócio que só existe no cinema holywoodiano, que isso não tem nada a ver com fazer música, fazer arte de verdade?
Como disse o Mário Bortolotto recentemente, sobre teatro, mas que se aplica perfeitamente a música: “(...) um espetáculo "dar certo" pra mim não é se transformar num sucesso retumbante, casa lotada e bilheteria astronômica. "Dar certo" pra mim no caso, é realizar um bom trabalho, ficar satisfeito com o que assisto da platéia.”
É isso que eu penso. E que esse papo de porque a cena isso ou aquilo já deu! A cena somos nós, somos aquilo que nós fazemos de nossas vidas, somos a gente que gosta e faz música e todo mundo que ta envolvido nisso. E desde que eu vim pra cá, lá nos anos 90, nunca teve uma semana em que não tivesse um show legal de uma banda fazendo um som de qualidade na cidade pra ver. E o JR ta lá até hoje, e o Ciro Ridal ta por aí produzindo programas de rádio e de televisão, e o pessoal do BAAF ta aí com a grande garagem, lançando mais uma panelada de discos de alto nível. E um monte de gente nova surgiu no pedaço, como o pessoal do tinidos, prasbandas, ruído corporation, etc. E se os jornalistas antenados que decidem o que é bom e o que não é nos mass media não sabem disso, quem tá perdendo são eles, e aqueles que dependem só deles pra se informar e não vão atrás de outras coisas, não nós. Porque o público também tem que ter curiosidade de não ficar só consumindo prato feito e ir atrás de coisas novas diferentes. De não se contentar só com mesmice, da mesma forma como a gente, lá nos anos 80/90, quando não tinha internet nem nada, copiava as músicas em fitinhas k7 que um ia passando pro outro e assim descobria coisas que não tavam rolando na mídia.
Então parem de falar que a cena não existe, que não tem nada, que nada dá certo, porque já deu certo há muito tempo. Se você acha realmente isso então cai fora ou pára de encher o saco! Quem fala isso ta que nem aquele cara que fica na frente da tv batendo punheta vendo um filme pornô e não vê a mulher dele passando pelada na frente. Vai lá e goza porra! Pára de nhenhenhém. Para de esperar as coisas dos outros, faça você mesmo e faça POR VOCÊ MESMO.
É isso que a gente ta tentando fazer desde sempre. E que vai continuar fazendo enquanto tiver forças. Nem que for só pra se reunir com os amigos no quintal, fazer um som, e dar muita risada. Porque no final das contas, o que se leva da vida é a satisfação que se tem em vivê-la.
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8 comentários:
caramba! é isso mesmo. e quanto ao Dusty, só gravar de uma vez a parada. registros, registros e mais registros, antes que ninhguém mais lembre (nós no caso) das músicas. abraço, brother.
certeza Rubens. vamolá!
falo e disse. so vc mesmo pra me dar saudade da terra do nunca. semana passada fui no show do einsturzende neubauten e lembrei de curitiba. dos amigos lembro sempre. e concordo com o camarao, se fosse rico famoso e didao continuaria um curitibano morando em londres. cena e coisa de jornalista picareta. o que vale e fazer, aqui, ali, la e agora. viva o dust, viva o oaeoz, viva o carlao,viva os chulos e os reles, viva-se. agora fico eu aqui sonhando em tocar no 92 e tomar um guaco. gravem ai, de qualquer forma eu nao esqueco, principalmente doque vale a pena ser lembrado, do que faz parte do que sou, da onde sou.
Caralho, que texto Ivan!!! Concordo em cada palavra. Considero esse meu presente de aniversário, só por expor em palavras aquilo que pensamos. A partir de agora existe um texto para qualquer momento de confusão poder consultar e firmar os pés no chão. Muito claro, muito legal e parabéns pra você também! E Marcelinho, com certeza você também é tão importante quanto as bandas que fazem história, porque você tava lá nos primeiros acordes de todas as bandas, documentando tudo e a gente aprendeu muito com isso. Tá documentado! Tem jam nova no myspace do Folhetim Urbano www.myspace.com/folhetimurbano.
viram-me na foto, eu tava ali em forma de luz. foi foda, mas ouvi tudo.
abs hermanosssss
eheh. valeu carlão. eu só falei o que tava sentindo. e eu nem preciso dizer o quanto eu me sinto em sintonia com você, hoje, nê. você sabe melhor do que ninguém. a gente sabe, porque a gente tá vivendo isso, aqui e agora, ninguém contou. abs e vamo aí brother. tamo junto!
Porra Ivan eu que não me manifesto quase nunca fique orgulhoso e feliz ler o seu texto realmente voce pegou la no fundo é isso realmente o que eu penso...grande abraço brother...
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