Como é bom ter som ao vivo em casa de novo. Desde que os ensaios d’oaeoz saíram da casa azul e foram pro estúdio do Carlão que não tinha os caras ensaiando, mesmo, em casa. Adoro isso. Fazer a janta, ler um livro ao som de Hotel Avenida. Lembro na casa das jabuticadas, as tardes de sábado, naquele sótão. A gente passava a tarde e parte da noite naquela, os “ensaios” sempre se prolongavam. Tinha festa junina com fogão à lenha. Soa até engraçado falar disso agora, mas é isso mesmo, pinhão na chapa, que sabor de infância! que cheiro forte de infância.. cheiro forte de lenha queimando que, volta e meia sinto, aqui nas redondezas, e sei que alguém acende
O Hotel Avenida ta ensaiando aqui em casa, com participação especial do Igor e do Allan, já que o Edu vai estar viajando e não poderá participar do show em homenagem ao Ivo no Tuc, que o Getúlio e o pessoal da GGG tão organizando pros próximos dias. Rolaram outros encontros, aos poucos foi voltando. Sei que eles precisam ver um estúdio e tal, mas, puxa vida, como é bom isso. Ouvir as músicas que só ouço no fone e as “novas”, muito boas também. Pena que tô sem câmera fotográfica. Não to acostumada a ficar só olhando, quero logo ir filmando, fotografando, registrando. Mas, enfim, essa é só pra mim. Vocês podem ouvir no TUC.
4/30/2010
4/29/2010
Hotel Avenida no programa Frente
E o programa Frente, produzido e apresentado por Henrique Portugal (Skank), incluiu recentemente em seu set list a faixa "Só o amor pode partir seus joelhos", da Hotel Avenida. Na mesma edição tem também outras duas bandas curitibanas, o Delta Cockers e Rosie And Me. Pra ouvir é só clicar em "home" e ir ao player do lado direito, em "lista", e escolher o programa de número 44.
Mais aqui.
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4/27/2010
Década dos diretores
To lendo um livro bem legal, sobre cinema. Mais especificamente sobre a geração 60, a que mudou, de verdade, o jeito de fazer filmes. Gente como Francis Ford Coppola, Warren Beatty (Bonnie and Clyde), Dennis Hopper (Sem Destino), George Lucas (o mais comportadinho!!!), Robert Altman, pra ficar entre alguns dos mais badalados. A geração que mudou o cinema e o levou pro caminho do mal, dizem e dirão alguns, com boas doses de razão. “Como a geração sexo-drogas-e-rock’n’roll salvou Hollywood", de Peter Biskind tem 502 páginas. Da 461 em diante são só notas, desde a lista de personagens, passando por filmografia dos principais diretores até a fonte de cada entrevista usada, a maioria, feitas pelo próprio autor. Incrível.
É muita, mas muita informação, reunida em um livro só. E por isso mesmo uma consulta na lista de quem é quem, volta e meia se faz necessária pra refrescar a memória. São muitos nomes de diretores, assistentes, produtores, atores, e executivos de várias empresas envolvidas e convivendo entre si, entre tapas, beijos e muita disputa de egos. Em permanente queda de braço para impor seus jeitos próprios de fazer cinema. Foi o nascimento do chamado ”cinema de diretor” ou de autor (auteur, emprestado do francês).
Poderoso Chefão, Shampoo, M*A*S*h, A ùltima Sessão, Sem Destino, Bonnie and Clyde entre vários outros marcos da produção mundial, alguns menos conhecidos, foram feitos neste período e, efetivamente, mudaram tudo dentro de um mundo que a gente que ta aqui deste lado, não tem a menor ideia.
Entre altos e baixos, foram feitos em meio disputas de poder, ego e grana, muita grana. De um lado, a “Velha Hollywood”, várias gerações de profissionais veteranos às voltas com a “Nova Hollywood” e seus (falta de) métodos, que pra espanto dos “donos” do negócio, conseguiam contra todas as projeções, ter bons resultados.
Em meio a histórias de bastidores das produções, sempre cheias de problemas, diga-se, o que se acompanha é o caminho feito pela industria rumo aos blockbuster que empesteiam os cinemas atuais, monopolizando-os e alimentando a gana neurótica de consumo desses tempos velozes.
No exato trecho da leitura em que estou, nasceu esta porcaria de sistema que coloca o mesmo filme, recheado de altas cifras, em praticamente todas as salas de praticamente todos os cinemas da cidade. Foi com o Poderoso Chefão – que Coppola só aceitou fazer pressionado para tentar salvar sua produtora a Zoetrope – que se deu a virada. Aliás, Coppola não queria de jeito nenhum fazer um filme comercial baseado em um Best seller (Mario Puzo); o produtor, Evans (não to lembrando o primeiro nome), da Paramount, não aceitava de jeito nenhum AL Pacino, como o Michael e o chefe deles não queria ouvir falar do “estrela problemática” Marlon Brandon - além do tempo de duração do "ultimo corte", um horror.... haha. E deu no que deu.
O Poderoso estreou em 316 salas de cinema e a cada semana novas 50 entravam no circuito, o que pôs abaixo a hegemonia de algumas salas que pelo “prestígio” conquistado mantinham o monopólio de exibição, em situações extremas, por até um ano. Se por um lado isso parece bom, com o acesso mais rápido pra mais gente, por outro, virou essa bola de neve que nos assola a cada grande lançamento.
Sobre Easy Rider, o livro mostra um pouco do temperamento difícil de Dennis Hopper, que na época já estava de mal com a industria e acabou fazendo sessões verdadeiramente caóticas de loucas gravações se transformarem em uma produção histórica, embebida no consumo das drogas populares naqueles anos. Mentes visionárias, porém completamente entorpecidas em entregues a uma força maior que eles, que até um ponto funcionaram a favor.
O primeiro tremor, no entanto, identifica o autor, foi em 67, com a ousadia sanguinolenta e risonha de Bonnie and Clyde, o primeiro tapa violento na cara da geração que criou o cinema. Aliás, este é um dos poucos filmes que lembro muito, mas muito da minha infância, de como gostei dele, embora com olhos chocados arregalados com aquele fim triste.
Foi ali que o poder começou a sair das mãos dos criadores do cinema. A passagem de bastão, não sem espernear, dos grandes estúdios e produtores, para os diretores e sua trupe. Com Gravações externas, como donos dos cortes finais e sem os rostinhos consagrados. Tudo virou de pernas para o ar. Ajudaram também a baixa dos lucros, claro, o que abriu a porta pra que novatos que topassem gastar pouco abrissem a porta, na virada dos anos 50 pros 60, uma explosão que pode ser vista mesmo na ultima metade daquela década.
“(...) nós queremos fazer filmes que sejam sobre coisa alguma. Como este Blow Up”, disse um executivo para um novo diretor. “Filmes independentes americanos ou filmes britânicos ou europeus de arte desgarrados, interessavam”, na ainda “velha Hollywood”.
Bom, estou no estouro de O Poderoso Chefão e não cheguei na metade do livro, ainda. Mas, passo o dia pensando na hora de ler mais um pedaço. Apesar de tantos nomes, tanta informação junta deixar meio zonza e com a sensação de que não to captando tudo, a leitura é deliciosa e toma conta. Só to dando uma parada agora pra ir ao cinema. O livro é da editora Intrínseca. Vale a pena pra quem gosta mesmo de cinema, biografias, pra gosta de ir além do que vê. (Adri)
PS: não tinha percebido até agora que a tradução é da maravilhosa Ana Maria Bahiana (tinha que ser!!!!)
4/21/2010
Flashback
hoje deu uma vontade de ouvir Legião...
"Acho que você não percebeu
Que o meu sorriso era sincero
Sou tão cínico às vezes
O tempo todo
Estou tentando me defender
Digam o que disserem
O mal do século é a solidão
Cada um de nós imerso em sua própria
arrogância
Esperando por um pouco de afeição
Hoje não estava nada bem
Mas a tempestade me distrai
Gosto dos pingos de chuva
Dos relâmpagos e dos trovões
Hoje à tarde foi um dia bom
Saí prá caminhar com meu pai
Conversamos sobre coisas da vida
E tivemos um momento de paz
É de noite que tudo faz sentido
No silêncio eu não ouço meus gritos
E o que disserem
Meu pai sempre esteve esperando por mim
E o que disserem
Minha mãe sempre esteve esperando por mim
E o que disserem
Meus verdadeiros amigos sempre esperaram por mim
E o que disserem
Agora meu filho espera por mim
Estamos vivendo
E o que disserem os nossos dias serão para sempre"
"Acho que você não percebeu
Que o meu sorriso era sincero
Sou tão cínico às vezes
O tempo todo
Estou tentando me defender
Digam o que disserem
O mal do século é a solidão
Cada um de nós imerso em sua própria
arrogância
Esperando por um pouco de afeição
Hoje não estava nada bem
Mas a tempestade me distrai
Gosto dos pingos de chuva
Dos relâmpagos e dos trovões
Hoje à tarde foi um dia bom
Saí prá caminhar com meu pai
Conversamos sobre coisas da vida
E tivemos um momento de paz
É de noite que tudo faz sentido
No silêncio eu não ouço meus gritos
E o que disserem
Meu pai sempre esteve esperando por mim
E o que disserem
Minha mãe sempre esteve esperando por mim
E o que disserem
Meus verdadeiros amigos sempre esperaram por mim
E o que disserem
Agora meu filho espera por mim
Estamos vivendo
E o que disserem os nossos dias serão para sempre"
4/20/2010
ela lembrou
Ela lembrou da ponta dos narizes de dois garotos sem jeito, numa noite chuvosa, roçando; lábios perdidos tateando no escuro. Ela lembrou disso enquanto observava os três montinhos de farelo amarelo levantados pelos cupins. Deitada sob os braços pensava, na verdade, no quanto é triste ver um amor desmoronar em acusações, frustrações despidas sem pudor ao longo de uma vida cheia de anos inteiros que parecem se desfazer do mesmo jeito que uma vassoura sem jeito pode tirar aqueles montes de madeira gasta pelo tempo e comida por esses bichinhos invisíveis que corroem e o deixam oco. À vista, as mágoas que põem na boca acusações pesadas.
Uma história bonita se desfazendo entre duas pessoas que construíram tanto mas não conseguiram sobreviver à imagem de si próprias, que vêem agora diante de um espelho rachado.
Depois de muitos dias de chuva, ontem o céu tava limpo, tinha até umas estrelas e um pouquinho de nuvens só pra se deixar envolver no charme da lua cheia que, desta vez, prenuncia.... mudanças? Sei lá....(Adri)
Uma história bonita se desfazendo entre duas pessoas que construíram tanto mas não conseguiram sobreviver à imagem de si próprias, que vêem agora diante de um espelho rachado.
Depois de muitos dias de chuva, ontem o céu tava limpo, tinha até umas estrelas e um pouquinho de nuvens só pra se deixar envolver no charme da lua cheia que, desta vez, prenuncia.... mudanças? Sei lá....(Adri)
4/16/2010
DasVelas
Taí. Banda nova no pedaço. Nossos brothers Allan Yokohama, Marano, Fabiano, e Igor, em trechos das gravações do primeiro disco, entre janeiro e março, no RJ, com produção do Carlos Trilha, que trabalhou com Renato Russo, Marisa Monte, etc. Dá pra ver pelo clima das gravações que teremos um grande disco por aí. Também, com essa turma de meliantes ia ser difícil errar. Sucesso moçada!
4/13/2010
Minha bela Graciosa
Ontem toquei os pés na água límpida do rio de pedras que corre ao lado da Estrada da Graciosa. Melhor que isso ainda, ouvi o barulho da brincadeira das águas, em sua ciranda com as pedras.
Elas, como sempre, me receberam de braços abertos, guria da cidade, desajeitada descendo a encosta.
Guria da cidade que veio do mato, e que por isso se sente em casa naquela velha estrada de paralelepípedo, cúmplice do silêncio dos dois.
Quando fui dormir, foi o som daquela brincadeira no rio o mantra que embalou meu sono. Cansada.
Hoje “Quero ser mais nada, demasia é frustração”.
Só quero a minha casa, os braços do meu amor, meus amigos bichos e capoeira.
Queria também ter um rio de pedras pra cantar aquele mantra pra mim.
Mas, puxa que alivio é, também, ouvir uma canção e descarregar essa pilha de nervos de cima de mim.
Radiare - Radiare:
“Quero ser mais nada/ demasia é frustração
me despertando de sonhos a idade toca toda manhã/
horizonte claro posso antever o fim/
que massada é essa
silêncio em que consentes
mente pra mim
Já perdi a vontade de não saber porque brigar
e a esportiva de cair, sorrir e levantar
uma razão pra eu ficar só
é mendigar um tempo a mais
e assim
vou doendo
Radiare espírito/
transcender como um som
suspirar a tarde
e anoitecendo
uma razão
tantos ofícios me encantavam, vigor em dispersão
se escolhas eram por capricho
agora não me troca outra opção
e hoje eu sinto dor nas costas
me restou uma paixão
então...
desviei meu olhar na origem dessa canção
nunca abandonei
sem mais forças para abraçar
tudo em todos vão
vão caber neste coração
(...)"
Elas, como sempre, me receberam de braços abertos, guria da cidade, desajeitada descendo a encosta.
Guria da cidade que veio do mato, e que por isso se sente em casa naquela velha estrada de paralelepípedo, cúmplice do silêncio dos dois.
Quando fui dormir, foi o som daquela brincadeira no rio o mantra que embalou meu sono. Cansada.
Hoje “Quero ser mais nada, demasia é frustração”.
Só quero a minha casa, os braços do meu amor, meus amigos bichos e capoeira.
Queria também ter um rio de pedras pra cantar aquele mantra pra mim.
Mas, puxa que alivio é, também, ouvir uma canção e descarregar essa pilha de nervos de cima de mim.
Radiare - Radiare:
“Quero ser mais nada/ demasia é frustração
me despertando de sonhos a idade toca toda manhã/
horizonte claro posso antever o fim/
que massada é essa
silêncio em que consentes
mente pra mim
Já perdi a vontade de não saber porque brigar
e a esportiva de cair, sorrir e levantar
uma razão pra eu ficar só
é mendigar um tempo a mais
e assim
vou doendo
Radiare espírito/
transcender como um som
suspirar a tarde
e anoitecendo
uma razão
tantos ofícios me encantavam, vigor em dispersão
se escolhas eram por capricho
agora não me troca outra opção
e hoje eu sinto dor nas costas
me restou uma paixão
então...
desviei meu olhar na origem dessa canção
nunca abandonei
sem mais forças para abraçar
tudo em todos vão
vão caber neste coração
(...)"
4/10/2010
cheiro de mato
Não esperava isso hoje. Uma canção. Uma canção do passado. São tantos os discos que passaram por mim e mesmo os que ficaram pra valer às vezes ficam quietos, lá no meio das lembranças especiais que a gente não lembra mas também não esquece. Aí, volta e meia, o Ivan coloca um desses pra tocar... é aquela avalanche. O de hoje foi Verdura, do Blindagem, por razões óbvias.
E de repente eu tava lá. No meio da visão embaçada estava de volta à Casa Verde, uma república estudantil de garotas nas redondezas da UEPG, em Ponta Grossa, no último ano e meio da década de 80. Na garagem da casa antiga morava o Ivan e aquele lugar é uma referência pra nossa turma, um marco: a garagem da casa verde.
oltei pra lá num dia de sol, as portas grandes abertas, o vento solto e o som alto se espalhando pelo terreno todo e indo pra vizinhança próxima. A gente por ali.
Uma sensação de braços abertos se entregando ao vento, bem como me senti algumas vezes fazendo aquele mesmo caminho em direção a minha república, ou indo pra alguma festa, mesmo com o ar gelado ressecando minha boca e me atravessando. Incrível o que a lembrança da gente é capaz de fazer com a ajuda da música.
“Não posso ver sangue/Fico logo vermelho/ Querendo chorar/Não, não posso ver sangue/Fico logo vermelho/Querendo chupar”
Um silêncio estrondoso explodiu segundos depois num soluço seco, quase inexplicável, de um instante pro outro, derrubando com o susto o caderno de jornal que eu lia.
“Não posso ver água, poço, rio, mar/Eu já começo a tirar a roupa/Louco pra mergulhar/ Não posso ver ninguém/Que eu já quero, que eu já quero namorar/”
Entrou aquela melodia que eu conhecia tão bem e não lembrava. E por perto tava também o Eglerson Alan, o amigo que dividiu o fundo (com “cascata natural de chuva”) da garagem, por um tempo. Foi com ele a primeira banda, Flor de Cactus. Não tinha me tocado, mas deve ter sido também a primeira banda que vi tão de perto assim, ensaiando e tal. O Eglerson Alan e seu sorriso aberto. (eu era a única que insistia em chamá-lo pelos dois nomes, ficou tão gravado que acho que se no meio de um povareu ele ouvir alguém chamá-lo assim, é capaz de saber que aquela baixinha ta por perto). Grande cara. Com ele não tinha tempo ruim e tomava porres homéricos e voltava pra casa carregando placas recolhidas da rua. Quase pude ouvi-lo novamente tocando e cantando...
(...) Aí entra o Ivan, saindo do trabalho olhos também avermelhados por suas próprias lembranças que também se revolveram. Só me olha, não diz nada e dá a volta. Ouvimos a música terminar sem palavras.
Quem precisa de palavras quando tem uma canção?
- Puxa vida, balbucio e um soluço baixo, esquisito, ainda escapa junto com a certeza de que na cabeça de nós dois o tempo retrocedeu. Em mim foi uma confusão e eu quase sempre traduzo isso em choro, mas nem sempre a lembranças brotam assim aos borbotões.
“Quando me lembro/ do cheiro do mato/da beira da estrada/de comer pinhão
Lembro do amor/de uma árvore/sem esperar/para ver nascer a flor...”
- ... essa também é...
novamente a música rouba as palavras da tentativa de explicar, comentar algo.
“E vou seguindo/ caminhado, me espalhando/tirando poeira do meu coração
eu vou, eu vou sem olhar para trás/ eu quero ir embora/antes de parar/E vou seguindo
caminhado, me espalhando/tirando poeira do meu coração/eu vou, eu vou sem olhar para trás/eu quero ir embora/antes de parar”
- incrível como este disco parece uma coletânea e não o primeiro disco de uma banda - comenta ele; eu continuo sem conseguir falar.
(...)
- uma boa pauta, contar a história desse disco. é um clássico. Vai fazer trinta anos.
- um bom projeto, um show. Será que eles têm algo em vista – digo, voltando.
- acho que sim, já falaram sobre isso e o Ivo mesmo disse que eles têm que continuar.
- Pô, taí: esse é um projeto que eu gostaria de participar.
Os jornalistas retomaram o controle da situação. Ao menos por agora. (adriperin)
E de repente eu tava lá. No meio da visão embaçada estava de volta à Casa Verde, uma república estudantil de garotas nas redondezas da UEPG, em Ponta Grossa, no último ano e meio da década de 80. Na garagem da casa antiga morava o Ivan e aquele lugar é uma referência pra nossa turma, um marco: a garagem da casa verde.
oltei pra lá num dia de sol, as portas grandes abertas, o vento solto e o som alto se espalhando pelo terreno todo e indo pra vizinhança próxima. A gente por ali.
Uma sensação de braços abertos se entregando ao vento, bem como me senti algumas vezes fazendo aquele mesmo caminho em direção a minha república, ou indo pra alguma festa, mesmo com o ar gelado ressecando minha boca e me atravessando. Incrível o que a lembrança da gente é capaz de fazer com a ajuda da música.
“Não posso ver sangue/Fico logo vermelho/ Querendo chorar/Não, não posso ver sangue/Fico logo vermelho/Querendo chupar”
Um silêncio estrondoso explodiu segundos depois num soluço seco, quase inexplicável, de um instante pro outro, derrubando com o susto o caderno de jornal que eu lia.
“Não posso ver água, poço, rio, mar/Eu já começo a tirar a roupa/Louco pra mergulhar/ Não posso ver ninguém/Que eu já quero, que eu já quero namorar/”
Entrou aquela melodia que eu conhecia tão bem e não lembrava. E por perto tava também o Eglerson Alan, o amigo que dividiu o fundo (com “cascata natural de chuva”) da garagem, por um tempo. Foi com ele a primeira banda, Flor de Cactus. Não tinha me tocado, mas deve ter sido também a primeira banda que vi tão de perto assim, ensaiando e tal. O Eglerson Alan e seu sorriso aberto. (eu era a única que insistia em chamá-lo pelos dois nomes, ficou tão gravado que acho que se no meio de um povareu ele ouvir alguém chamá-lo assim, é capaz de saber que aquela baixinha ta por perto). Grande cara. Com ele não tinha tempo ruim e tomava porres homéricos e voltava pra casa carregando placas recolhidas da rua. Quase pude ouvi-lo novamente tocando e cantando...
(...) Aí entra o Ivan, saindo do trabalho olhos também avermelhados por suas próprias lembranças que também se revolveram. Só me olha, não diz nada e dá a volta. Ouvimos a música terminar sem palavras.
Quem precisa de palavras quando tem uma canção?
- Puxa vida, balbucio e um soluço baixo, esquisito, ainda escapa junto com a certeza de que na cabeça de nós dois o tempo retrocedeu. Em mim foi uma confusão e eu quase sempre traduzo isso em choro, mas nem sempre a lembranças brotam assim aos borbotões.
“Quando me lembro/ do cheiro do mato/da beira da estrada/de comer pinhão
Lembro do amor/de uma árvore/sem esperar/para ver nascer a flor...”
- ... essa também é...
novamente a música rouba as palavras da tentativa de explicar, comentar algo.
“E vou seguindo/ caminhado, me espalhando/tirando poeira do meu coração
eu vou, eu vou sem olhar para trás/ eu quero ir embora/antes de parar/E vou seguindo
caminhado, me espalhando/tirando poeira do meu coração/eu vou, eu vou sem olhar para trás/eu quero ir embora/antes de parar”
- incrível como este disco parece uma coletânea e não o primeiro disco de uma banda - comenta ele; eu continuo sem conseguir falar.
(...)
- uma boa pauta, contar a história desse disco. é um clássico. Vai fazer trinta anos.
- um bom projeto, um show. Será que eles têm algo em vista – digo, voltando.
- acho que sim, já falaram sobre isso e o Ivo mesmo disse que eles têm que continuar.
- Pô, taí: esse é um projeto que eu gostaria de participar.
Os jornalistas retomaram o controle da situação. Ao menos por agora. (adriperin)
4/09/2010
Meu voo é volta de qualquer lugar: até mais Ivo
Ivo Rodrigues lutou,lutou e agora partiu, enfim. Fico triste. Mas acho que ele vai em paz, como disse uma das últimas vezes que conversou comigo, sobre estar gravando suas músicas solo, antes ainda do transplante, se não faço confusão. Ele disse que tava pronto pra morrer, que tava tudo certo e bem vivido na vida dele. Isso não é pouco. Uma das belas lembranças que tenho de minha profissão é deste cara me deixando emocionada, olhos mareados mesmo ( e a jornalista sem conseguir disfarçar..) num boteco perto da casa dele, que foi o escolhido pra uma conversa sobre o rock paranaense, sua história, da sua banda. Entrevistas eu faço todo dia, mas conversar com alguém que tem uma vida bem forte pulsando dentro de si, não é todo dia não. E saí daquele boteco cheia de vida, certa de que estava fazendo a coisa certa da minha vida também e que, também para celebrar pessoas como ele, tinha que continuar vivendo minha vida daquele jeitinho mesmo. Também lembro de um dia no Bife Sujo em que o ivan pediu pra ele cantar "O Berro" (gravada pela Patrulha do Espaço), uma música muito antiga, que ele não lembrou mas cantou outras, naquele antigo boteco que guardou histórias tantas da turma dele e de outras. foi bonito e triste, porque achava que ele merecia estar num lugar de mais destaque (o que voltou a acontecer depois). Me fez pensar em passado e futuro de novo.
Enfim, o Ivo Blindagem morreu e digam o que disserem perdemos um grande cara. O rock paranaense, sulista e nacional está um pouco mais quieto hoje.
Uma das minhas músicas preferidas entre as que ele canta:
"Sou gaivota por sobre o mar
Meu vôo é volta
De qualquer lugar
Desapareço no tempo, no ar
Antes que um olho
Consiga piscar
Num vôo razante
O que eu vi
Não dá pra acreditar
Dá pra acreditar
Minhas penas tremendo
Me levem daqui
Faço parte do vento
Vou me embora correndo
Se acalme..."
Adri Perin
4/08/2010
Troco o mundo virtual por uma vida real
“Esses dias vi uma banda tocar. Quando saíram do palco, deixaram todo o equipamento deles lá jogado. Eles estavam abrindo para outra banda, mas sequer pensaram em tirar as coisas deles de lá. Eles vinham de um mundo onde você não cuida de seu próprio equipamento. Para mim, o processo é uma parte tão importante da arte. Ele 'é' a arte. Não é só: 'Oh, nossa, que disco bonito' ou 'esse disco soa maravilhoso', é o processo. É o fazer o disco, e o marcar os shows. Eu vejo isso como uma arte”.
Ian MacKaye (Fugazi) – no livro “Não devemos nada a você”, coletânea de entrevistas da revista Punk Planet.
Achei muito interessante esse trecho da entrevista do MacKaye, porque ele acaba abordando um ponto que pra mim tem um paralelo direto com muito dos problemas que vejo na cena independente brasileira, em geral, e na curitibana em particular hoje. É aquela coisa, todo mundo quer posar de artista, mas ninguém quer se incomodar com tudo o mais que envolve o fazer artístico, ou com tudo o que é relacionado com o antes e depois de você subir no palco. A coisa chegou num ponto em que neguinho quer ter banda, quer tocar, mas nunca tem tempo pra ensaiar, pra trabalhar aquilo, marcar show, lidar com as burocracias naturais pra, por exemplo, apresentar um projeto, buscar apoios, patrocínios. A maioria ainda parece querer que outros façam por eles o que eles deviam fazer por si mesmos. E com isso, acaba deixando de aproveitar as poucas oportunidades que existem. Pior, quer fazer música, quer tocar junto, mas não quer se relacionar, não é capaz de reservar um tempo pra tomar uma cerveja junto, conversar, bater papo, falar merda. É o mundo do "virtual", dos relacionamentos "on line", da vida higienizada e sem vida.
Como ninguém é obrigado a trabalhar de graça para os outros, e a maioria das bandas não gera renda suficiente para pagar um produtor/empresário, temos uma equação que não fecha.
Isso também se reflete em uma quase total falta de comprometimento com as iniciativas que poderiam potencializar a cena, e acabam se esvaziando já que se nem os músicos tem interesse no que está acontecendo, como esperar que o público em geral o faça. Isso me lembra também um trecho da recente entrevista do Rómulo Froes no Scream Yell:
“E eu fico puto porque nenhum cara vai ao show do outro. Ninguém foi me ver tocar até hoje. Com exceção ao Bruno, que é muito meu amigo, e tem uns caras novos que eu conheci agora. Curumin nunca foi ao meu show. Catatau nunca foi. Andréa Dias nunca foi. Leo Cavalcanti também não. Só estou falando de todos que eu fui. Porque, cara, você tem que ir! Por interesse artístico, pra ajudar a cena, pra sair de casa. Vai ver seu amigo, porque se você não for ele não vai conseguir tocar mais. Eu fico: “Moçada, tenho uma festa no CB, vamos lá, a casa paga cachê bacana, vai lá ver, vê o bar, vê que a festa é legal, depois você vai lá tocar”. Eu acho foda essa coisa de um não ver o show do outro. A galera gosta tanto que toca junto, grava disco, mas eu acho que tem que ser mais do que isso. Tem que prestigiar. Você não pode ir lá só quando for gravar o disco. Vai lá porque você gosta, e fala pros outros. Isso eu sinto falta, de neguinho não fazer a cena virar.”
O que o Rômulo fala sobre a cena de SP é um problema generalizado que acontece em todo o País, inclusive em Curitiba. Digo isso de carteirinha, porque cansei de ver bandas que iam tocar no Rock de Inverno, e que tinham entrada franqueada em todos os dias, só aparecer no dia e na hora que ia tocar, e muitas vezes, depois disso, virava as costas e ia embora. Ou seja, não se interessava sequer de prestigiar o evento do qual elas faziam parte, e conhecer as outras bandas que iam tocar no mesmo dia que ela. Acho isso uma puta duma demonstração de desinteresse, de egocentrismo explícito, e de falta de comprometimento que diz muito sobre o estado atual das coisas. Repito, se nem os músicos se interessam em conhecer e prestigiar a cena e seus pares, como esperar que o público queira? Ou a mídia, de quem tanto os artistas cobram mais atenção?
Isso sem falar nas bandas que vivem fazendo discursos empolados de “temos que nos unir”, "temos que nos organizar", "temos que ser profissionais" e tal, mas não são capazes de distribuir um cartaz ou uma filipeta para divulgar o evento em que elas próprias estarão. Aí fica fácil. Aí até eu quero ser artista.
Desde cedo percebi que se eu quisesse conquistar algum espaço com minha música, teria que eu mesmo que arregaçar as mangas e partir para a luta. Não tem gravadora, a gente cria um selo, ninguém chama a gente pra tocar, a gente produz os nossos próprios shows, ninguém dá atenção pra o que a gente faz, a gente se junta com mais gente que tem a ver e faz um festival. E mesmo que não tenhamos conseguido tudo aquilo que gostaríamos ou ingenuamente sonhávamos em algum momento, não posso reclamar, pois tudo o que a gente fez foi muito bem recebido, teve atenção, repercutiu e foi muito mais longe até do que a gente imaginava. E isso só aconteceu graças a muito trabalho, iniciativa, da amizade e parceria e esforço conjunto de um monte de gente, ao invés dos costumeiros choramingos, coitadismos e teorias conspiratórias pra justificar a inércia.
Cansei de varar noites gravando CD, imprimindo, cortando, dobrando e colando capas de discos meus e de outros. Perdi a conta dos discos de outras bandas que eu fiz cópia pra mandar pra jornalistas, produtores, etc. E fazer isso nunca foi um peso, um problema, um sacrifício. Pelo contrário, sempre fiz isso com uma baita alegria no coração de saber que eu tava fazendo parte daquilo, vivendo o meu tempo, escrevendo a minha história e a de um monte de gente que eu admirava. Pois como diz o MacKye, isso tudo pra mim era parte inestimável e inseparável do processo criativo e me dava tanta satisfação quanto estar em cima de um palco se apresentando.
Aliás, sempre disse já na época do OAEOZ que gostava mais de ensaiar do que de fazer show. Pra mim era um prazer. Música pra mim sempre foi uma atividade gregária, essa coisa de juntar os amigos e fazer um som, em primeiro lugar. De tomar umas e fazer um churras, e uma jam. Ensaiar pra mim sempre foi a melhor coisa, mesmo quando a gente tinha que ensaiar as 9 horas da manhã de uma quarta-feira, e depois sair correndo pro trabalho. Aquilo pra mim ganhava meu dia. Mais do que uma banda, a gente era uma turma de amigos que curtia estar junto fazendo aquilo, vivendo aquilo. Hoje tá todo mundo ocupado demais com os MSNs, os orkuts, os twitters da vida pra se relacionar de verdade. Alguma coisa se perdeu.
Quando você pensa no pessoal da Tropicália, por exemplo, vê a diferença de atitude, como o próprio Rômulo aborda rapidamente na entrevista. Os caras tavam sempre juntos, e sempre trabalhando em parceria. O Caetano gravava músicas do Gil, que gravava músicas do Caetano, que tinham suas músicas cantadas pela Gal, pela Bethânia, pelos Mutantes, que tocavam em shows do Caetano e do Gil, que falavam dos Mutantes nas entrevistas, etc.
Se a gente for pensar no que ficou conhecida como “Vanguarda Paulistana”, apesar de ser calcada em uma vanguarda paranaense (Arrigo e Paulo Barnabé e Itamar Assumpção, etc), a mesma coisa. Itamar tocava baixo na banda do Arrigo, que tinha o irmão na bateria, que também tocava com o Itamar, etc. Pensando no rock dos anos 80, você via a Legião tocando Plebe Rude nos shows, o Paralamas tocando musicas da Legião, e mesmo depois, já nos anos 90, o Renato Russo usando camiseta do Pato Fu nas fotos para a imprensa. Enfim.
Lembro ainda de quando conheci a cena que rolava no 92 graus, no início dos anos 90, e como havia um sentimento de “comunidade”, de todo mundo se conhecer e de pertencer aquele momento, de tocar junto e ver o show do outro, mesmo que não fosse o seu estilo preferido. O pessoal da Reles via os shows do Boi Mamão, que curtiam os do Magog, que tava lá vendo o Acrilírico. A gente mesmo, eu e a Adri, cansamos de ir ao 92 sem nem saber quem ia tocar naquele dia, e graças a isso conhecemos um monte de coisas diferentes que normalmente não iriamos ver, de Cervejas a Pinheads, e muitos outros.
Hoje parece que tudo virou um clubinho “vip” excludente, um gueto. Todo mundo fechado em seu próprio mundinho de pretensão e arrogância, e falsa autosuficiencia. Neguinho é fã de hardcore, então só vê show de hardcore, o indie só vai no bar dos indies, headbangers só se misturam com headbantgers e daí por diante. O resultado é que a cena toda se fragmentou e se enfraqueceu, se fragilizou, em pequenos grupos isolados que não se relacionam.
Enquanto as pessoas não mudarem de atitude, começando pelos próprios músicos, e se interessarem pelas coisas que estão acontecendo em volta delas, ao invés de ficar apenas lambendo o próprio umbigo, nada vai mudar. Veremos cada vez mais espaços como o 92 se fechando, bandas acabando, pessoas desistindo pelo meio do caminho.
Como disse a Adri, onde estão os novos produtores? A turma que ia fazer e acontecer e mudar tudo? Cansei de ouvir discursos vazios de gente que achava que ia reinventar a roda e na primeira pedra, caiu de boca no chão e não se levantou mais. Enquanto isso, quem ainda continua fazendo as coisas por aqui? Os mesmos “veteranos” de sempre, de gente de gerações ainda anteriores à nossa, como o pessoal da Grande Garagem/BAAF, do JR, do Ciro Ridal, ou de gente contemporânea à nossa turma, de gente que já deveria estar "superada" e substituída por uma nova geração de produtores/iniciativas. Um monte de novas iniciativas que surgiram desde então, naufragaram na primeira onda contrária. O que é uma pena. Alguma coisa está errada. Posso não saber exatamente o que, nem como mudar isso, mas não me sinto nem um pouco otimista. Fala-se tanto em internet, essa onda virtual e tal, mas em certas coisas – eu diria nas mais importantes – nada substitui a presença real, física. Porque sem ela, não há comprometimento, e sem comprometimento, tudo o que fica são discursos vazios, e sonhos frustrados, abandonados pela metade.
Apesar de todo o cansaço, continuo sendo um sonhador. Acho que temos tudo pra virar o jogo, se quisermos. Acho que tem uma galera nova por aí que pode fazer isso. Mas é preciso iniciativa. Do contrário, nos tornaremos todos pessoas distantes e amarguradas. Uma geração sem vontade. Incapaz de dar o primeiro passo e sair da casca.
Ian MacKaye (Fugazi) – no livro “Não devemos nada a você”, coletânea de entrevistas da revista Punk Planet.
Achei muito interessante esse trecho da entrevista do MacKaye, porque ele acaba abordando um ponto que pra mim tem um paralelo direto com muito dos problemas que vejo na cena independente brasileira, em geral, e na curitibana em particular hoje. É aquela coisa, todo mundo quer posar de artista, mas ninguém quer se incomodar com tudo o mais que envolve o fazer artístico, ou com tudo o que é relacionado com o antes e depois de você subir no palco. A coisa chegou num ponto em que neguinho quer ter banda, quer tocar, mas nunca tem tempo pra ensaiar, pra trabalhar aquilo, marcar show, lidar com as burocracias naturais pra, por exemplo, apresentar um projeto, buscar apoios, patrocínios. A maioria ainda parece querer que outros façam por eles o que eles deviam fazer por si mesmos. E com isso, acaba deixando de aproveitar as poucas oportunidades que existem. Pior, quer fazer música, quer tocar junto, mas não quer se relacionar, não é capaz de reservar um tempo pra tomar uma cerveja junto, conversar, bater papo, falar merda. É o mundo do "virtual", dos relacionamentos "on line", da vida higienizada e sem vida.
Como ninguém é obrigado a trabalhar de graça para os outros, e a maioria das bandas não gera renda suficiente para pagar um produtor/empresário, temos uma equação que não fecha.
Isso também se reflete em uma quase total falta de comprometimento com as iniciativas que poderiam potencializar a cena, e acabam se esvaziando já que se nem os músicos tem interesse no que está acontecendo, como esperar que o público em geral o faça. Isso me lembra também um trecho da recente entrevista do Rómulo Froes no Scream Yell:
“E eu fico puto porque nenhum cara vai ao show do outro. Ninguém foi me ver tocar até hoje. Com exceção ao Bruno, que é muito meu amigo, e tem uns caras novos que eu conheci agora. Curumin nunca foi ao meu show. Catatau nunca foi. Andréa Dias nunca foi. Leo Cavalcanti também não. Só estou falando de todos que eu fui. Porque, cara, você tem que ir! Por interesse artístico, pra ajudar a cena, pra sair de casa. Vai ver seu amigo, porque se você não for ele não vai conseguir tocar mais. Eu fico: “Moçada, tenho uma festa no CB, vamos lá, a casa paga cachê bacana, vai lá ver, vê o bar, vê que a festa é legal, depois você vai lá tocar”. Eu acho foda essa coisa de um não ver o show do outro. A galera gosta tanto que toca junto, grava disco, mas eu acho que tem que ser mais do que isso. Tem que prestigiar. Você não pode ir lá só quando for gravar o disco. Vai lá porque você gosta, e fala pros outros. Isso eu sinto falta, de neguinho não fazer a cena virar.”
O que o Rômulo fala sobre a cena de SP é um problema generalizado que acontece em todo o País, inclusive em Curitiba. Digo isso de carteirinha, porque cansei de ver bandas que iam tocar no Rock de Inverno, e que tinham entrada franqueada em todos os dias, só aparecer no dia e na hora que ia tocar, e muitas vezes, depois disso, virava as costas e ia embora. Ou seja, não se interessava sequer de prestigiar o evento do qual elas faziam parte, e conhecer as outras bandas que iam tocar no mesmo dia que ela. Acho isso uma puta duma demonstração de desinteresse, de egocentrismo explícito, e de falta de comprometimento que diz muito sobre o estado atual das coisas. Repito, se nem os músicos se interessam em conhecer e prestigiar a cena e seus pares, como esperar que o público queira? Ou a mídia, de quem tanto os artistas cobram mais atenção?
Isso sem falar nas bandas que vivem fazendo discursos empolados de “temos que nos unir”, "temos que nos organizar", "temos que ser profissionais" e tal, mas não são capazes de distribuir um cartaz ou uma filipeta para divulgar o evento em que elas próprias estarão. Aí fica fácil. Aí até eu quero ser artista.
Desde cedo percebi que se eu quisesse conquistar algum espaço com minha música, teria que eu mesmo que arregaçar as mangas e partir para a luta. Não tem gravadora, a gente cria um selo, ninguém chama a gente pra tocar, a gente produz os nossos próprios shows, ninguém dá atenção pra o que a gente faz, a gente se junta com mais gente que tem a ver e faz um festival. E mesmo que não tenhamos conseguido tudo aquilo que gostaríamos ou ingenuamente sonhávamos em algum momento, não posso reclamar, pois tudo o que a gente fez foi muito bem recebido, teve atenção, repercutiu e foi muito mais longe até do que a gente imaginava. E isso só aconteceu graças a muito trabalho, iniciativa, da amizade e parceria e esforço conjunto de um monte de gente, ao invés dos costumeiros choramingos, coitadismos e teorias conspiratórias pra justificar a inércia.
Cansei de varar noites gravando CD, imprimindo, cortando, dobrando e colando capas de discos meus e de outros. Perdi a conta dos discos de outras bandas que eu fiz cópia pra mandar pra jornalistas, produtores, etc. E fazer isso nunca foi um peso, um problema, um sacrifício. Pelo contrário, sempre fiz isso com uma baita alegria no coração de saber que eu tava fazendo parte daquilo, vivendo o meu tempo, escrevendo a minha história e a de um monte de gente que eu admirava. Pois como diz o MacKye, isso tudo pra mim era parte inestimável e inseparável do processo criativo e me dava tanta satisfação quanto estar em cima de um palco se apresentando.
Aliás, sempre disse já na época do OAEOZ que gostava mais de ensaiar do que de fazer show. Pra mim era um prazer. Música pra mim sempre foi uma atividade gregária, essa coisa de juntar os amigos e fazer um som, em primeiro lugar. De tomar umas e fazer um churras, e uma jam. Ensaiar pra mim sempre foi a melhor coisa, mesmo quando a gente tinha que ensaiar as 9 horas da manhã de uma quarta-feira, e depois sair correndo pro trabalho. Aquilo pra mim ganhava meu dia. Mais do que uma banda, a gente era uma turma de amigos que curtia estar junto fazendo aquilo, vivendo aquilo. Hoje tá todo mundo ocupado demais com os MSNs, os orkuts, os twitters da vida pra se relacionar de verdade. Alguma coisa se perdeu.
Quando você pensa no pessoal da Tropicália, por exemplo, vê a diferença de atitude, como o próprio Rômulo aborda rapidamente na entrevista. Os caras tavam sempre juntos, e sempre trabalhando em parceria. O Caetano gravava músicas do Gil, que gravava músicas do Caetano, que tinham suas músicas cantadas pela Gal, pela Bethânia, pelos Mutantes, que tocavam em shows do Caetano e do Gil, que falavam dos Mutantes nas entrevistas, etc.
Se a gente for pensar no que ficou conhecida como “Vanguarda Paulistana”, apesar de ser calcada em uma vanguarda paranaense (Arrigo e Paulo Barnabé e Itamar Assumpção, etc), a mesma coisa. Itamar tocava baixo na banda do Arrigo, que tinha o irmão na bateria, que também tocava com o Itamar, etc. Pensando no rock dos anos 80, você via a Legião tocando Plebe Rude nos shows, o Paralamas tocando musicas da Legião, e mesmo depois, já nos anos 90, o Renato Russo usando camiseta do Pato Fu nas fotos para a imprensa. Enfim.
Lembro ainda de quando conheci a cena que rolava no 92 graus, no início dos anos 90, e como havia um sentimento de “comunidade”, de todo mundo se conhecer e de pertencer aquele momento, de tocar junto e ver o show do outro, mesmo que não fosse o seu estilo preferido. O pessoal da Reles via os shows do Boi Mamão, que curtiam os do Magog, que tava lá vendo o Acrilírico. A gente mesmo, eu e a Adri, cansamos de ir ao 92 sem nem saber quem ia tocar naquele dia, e graças a isso conhecemos um monte de coisas diferentes que normalmente não iriamos ver, de Cervejas a Pinheads, e muitos outros.
Hoje parece que tudo virou um clubinho “vip” excludente, um gueto. Todo mundo fechado em seu próprio mundinho de pretensão e arrogância, e falsa autosuficiencia. Neguinho é fã de hardcore, então só vê show de hardcore, o indie só vai no bar dos indies, headbangers só se misturam com headbantgers e daí por diante. O resultado é que a cena toda se fragmentou e se enfraqueceu, se fragilizou, em pequenos grupos isolados que não se relacionam.
Enquanto as pessoas não mudarem de atitude, começando pelos próprios músicos, e se interessarem pelas coisas que estão acontecendo em volta delas, ao invés de ficar apenas lambendo o próprio umbigo, nada vai mudar. Veremos cada vez mais espaços como o 92 se fechando, bandas acabando, pessoas desistindo pelo meio do caminho.
Como disse a Adri, onde estão os novos produtores? A turma que ia fazer e acontecer e mudar tudo? Cansei de ouvir discursos vazios de gente que achava que ia reinventar a roda e na primeira pedra, caiu de boca no chão e não se levantou mais. Enquanto isso, quem ainda continua fazendo as coisas por aqui? Os mesmos “veteranos” de sempre, de gente de gerações ainda anteriores à nossa, como o pessoal da Grande Garagem/BAAF, do JR, do Ciro Ridal, ou de gente contemporânea à nossa turma, de gente que já deveria estar "superada" e substituída por uma nova geração de produtores/iniciativas. Um monte de novas iniciativas que surgiram desde então, naufragaram na primeira onda contrária. O que é uma pena. Alguma coisa está errada. Posso não saber exatamente o que, nem como mudar isso, mas não me sinto nem um pouco otimista. Fala-se tanto em internet, essa onda virtual e tal, mas em certas coisas – eu diria nas mais importantes – nada substitui a presença real, física. Porque sem ela, não há comprometimento, e sem comprometimento, tudo o que fica são discursos vazios, e sonhos frustrados, abandonados pela metade.
Apesar de todo o cansaço, continuo sendo um sonhador. Acho que temos tudo pra virar o jogo, se quisermos. Acho que tem uma galera nova por aí que pode fazer isso. Mas é preciso iniciativa. Do contrário, nos tornaremos todos pessoas distantes e amarguradas. Uma geração sem vontade. Incapaz de dar o primeiro passo e sair da casca.
4/06/2010
92 Graus em situação de emergência
Juliana Girardi
Gazeta de hoje
“Tudo o que dependeu de mim neste tempo todo, fiz com todas as minhas forças e com tudo o que tinha e o que não tinha, porém sem resultados positivos, só balada mesmo, e isto não muda em nada a postura e o futuro de nossa arte, que está à deriva, ainda mais com a nova onda dos covers e pistas de dança que invadem a cidade.”
Essas são apenas algumas linhas da mensagem de desabafo que o músico e produtor JR Ferreira, proprietário da histórica casa de shows independentes 92 Graus, enviou há duas semanas a alguns amigos. Após 18 anos de serviços prestados ao underground curitibano e nacional, o 92 Graus parece dar seus últimos suspiros neste mês. “Estou cansado, pensando mesmo em dar um tempo. Venho tentando encontrar formas de manter o bar aberto de uma maneira financeiramente viável, mas está difícil. Acho que dessa vez, não vai ter jeito”, lamenta o músico, visivelmente triste.
Além das razões citadas no primeiro parágrafo do texto, o desânimo de JR deve-se a uma combinação de acontecimentos infelizes, que vêm dificultando sua vida de empreendedor independente. A primeira e mais preocupante delas é a renovação do contrato do imóvel que hoje abriga o 92 Graus, no bairro São Francisco. A imobiliária pretende dobrar o valor da locação, o que tornaria o funcionamento do bar impraticável. “Apresentamos uma contraproposta e teremos um retorno nas próximas semanas”, explica.
Fora o impasse imobiliário, um pequeno incêndio em um dos banheiros do bar, há duas semanas, complicou ainda mais as coisas, gerando gastos imprevistos. Para completar, JR teve as senhas violadas de suas contas no Orkut e no Gmail, impossibilitando a divulgação dos shows e o contato com as bandas, já que sua lista de e-mails foi totalmente excluída. O prazo de validade do domínio do site do bar (www.92graus.com) também venceu e não foi renovado devido à incerteza se o local continuará aberto ou não. “Tudo o que podia acontecer de ruim veio ao mesmo tempo”, diz.
Como possíveis soluções, JR vem buscando parceiros que possam investir no bar, mas a ideia de “passar o ponto” adiante, por enquanto, lhe parece a alternativa mais provável. “Estou analisando tudo como um negócio mesmo. Penso em vender a marca 92 Graus, que inclui o equipamento para shows e o alvará para bandas ao vivo”, revela.
Segundo o músico, até o dia 27 de abril o bar ainda irá contar com uma programação de festas e shows, que serão divulgados nos próximos dias, marcando a despedida do espaço e, quem sabe, o mantendo “respirando” por mais algumas semanas. Enquanto isso, JR está aceitando ideias e propostas que possam garantir o funcionamento do espaço. Basta entrar em contato pelo e-mail 92graus@bol.com.br.
Gazeta de hoje
“Tudo o que dependeu de mim neste tempo todo, fiz com todas as minhas forças e com tudo o que tinha e o que não tinha, porém sem resultados positivos, só balada mesmo, e isto não muda em nada a postura e o futuro de nossa arte, que está à deriva, ainda mais com a nova onda dos covers e pistas de dança que invadem a cidade.”
Essas são apenas algumas linhas da mensagem de desabafo que o músico e produtor JR Ferreira, proprietário da histórica casa de shows independentes 92 Graus, enviou há duas semanas a alguns amigos. Após 18 anos de serviços prestados ao underground curitibano e nacional, o 92 Graus parece dar seus últimos suspiros neste mês. “Estou cansado, pensando mesmo em dar um tempo. Venho tentando encontrar formas de manter o bar aberto de uma maneira financeiramente viável, mas está difícil. Acho que dessa vez, não vai ter jeito”, lamenta o músico, visivelmente triste.
Além das razões citadas no primeiro parágrafo do texto, o desânimo de JR deve-se a uma combinação de acontecimentos infelizes, que vêm dificultando sua vida de empreendedor independente. A primeira e mais preocupante delas é a renovação do contrato do imóvel que hoje abriga o 92 Graus, no bairro São Francisco. A imobiliária pretende dobrar o valor da locação, o que tornaria o funcionamento do bar impraticável. “Apresentamos uma contraproposta e teremos um retorno nas próximas semanas”, explica.
Fora o impasse imobiliário, um pequeno incêndio em um dos banheiros do bar, há duas semanas, complicou ainda mais as coisas, gerando gastos imprevistos. Para completar, JR teve as senhas violadas de suas contas no Orkut e no Gmail, impossibilitando a divulgação dos shows e o contato com as bandas, já que sua lista de e-mails foi totalmente excluída. O prazo de validade do domínio do site do bar (www.92graus.com) também venceu e não foi renovado devido à incerteza se o local continuará aberto ou não. “Tudo o que podia acontecer de ruim veio ao mesmo tempo”, diz.
Como possíveis soluções, JR vem buscando parceiros que possam investir no bar, mas a ideia de “passar o ponto” adiante, por enquanto, lhe parece a alternativa mais provável. “Estou analisando tudo como um negócio mesmo. Penso em vender a marca 92 Graus, que inclui o equipamento para shows e o alvará para bandas ao vivo”, revela.
Segundo o músico, até o dia 27 de abril o bar ainda irá contar com uma programação de festas e shows, que serão divulgados nos próximos dias, marcando a despedida do espaço e, quem sabe, o mantendo “respirando” por mais algumas semanas. Enquanto isso, JR está aceitando ideias e propostas que possam garantir o funcionamento do espaço. Basta entrar em contato pelo e-mail 92graus@bol.com.br.
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